terça-feira, 8 de abril de 2014

Greve dos trabalhadores da UFSC segue forte



Trabalhadores da UFSC em greve desde o dia 17 de março lacraram, nessa manhã do dia 08 de abril, a entrada do Prédio Santa Clara, onde funciona a administração central da UFSC. O objetivo é chamar a atenção da comunidade para a pauta de luta que inclui melhorias salariais, condições de trabalho, acertos no Plano de Cargos e defesa do HU público.  

São sete e meia da manhã e a universidade já está em ebulição. Aos poucos, os alunos vão chegando, buscando a salas onde passarão a manhã, em aulas ou pesquisas. Eles não percebem, mas a porta que encontraram escancarada foi aberta por alguém que chegou bem antes. Circulando pelos Centros, também é custoso pensar que tudo aquilo está limpinho porque alguém limpou. As notas foram digitadas no currículo, os materiais dos laboratórios foram lavados e arrumados, pesquisas foram realizadas, jardins foram embelezados, animaizinhos foram cuidados. Tudo isso é trabalho do técnico-administrativo em educação (TAE), uma das categorias que dá vida à universidade juntamente com os professores. E não se trata de dizer que há uma divisão entre trabalho manual e intelectual. Toda ação desenvolvida por um TAE, seja ela a de simplesmente garantir a abertura das salas ou de finalizar uma pesquisa, está amparada numa ação intelectual. Da mesma forma que a do professor que tem como tarefa, repassar e criar conhecimento.

Pois essa categoria dos técnico-administrativos em educação que, no mais das vezes, é completamente invisível, está e greve desde o dia 17 de março. Alguém poderia dizer: “mas, de novo?” É, de novo. Porque, ao contrário dos trabalhadores da iniciativa privada, os trabalhadores públicos não têm data base, ou seja, não há um mês específico no qual os patrões são obrigados a repor as perdas do ano.  Assim, cada vez que a inflação come o salário deles, é preciso iniciar uma luta. Nenhum governo assumiu o compromisso com a data-base. É por isso que todo avanço salarial ou de condições de trabalho acaba se dando só a partir das greves. Logo, não é culpa dos trabalhadores. A greve torna-se a última carta de um longo processo de negociação.

No ano de 2012, os trabalhadores realizaram uma greve para garantir reposição salarial e para manter os HUs públicos. Foi uma batalha demorada que terminou com um acordo muito fraco. O governo comprometia-se em repassar uma reposição escalonada, dividida em 5% a cada ano, até 2015. E também comprometia-se em terminar grupos de trabalho para resolver alguns problemas que perduram no Plano de Cargos dos TAEs, relacionados a enquadramento, qualificação, capacitação, terceirizados e cargos extintos. Foi o que deu para garantir. Ao longo de 2013 e 2014 o governo honrou os 5%, mas não avançou em nada nos GTs. Não bastasse essa enrolação com relação ao Plano de Cargos, a inflação já comeu bem mais do que os 15% acertados em 2012. Daí a necessidade de renegociar. E não pensem que faltaram reuniões para que isso se desse sem greve. Muitas foram realizadas, mas o governo não cedeu um ponto. Sem alternativa, os trabalhadores decidiram parar.

A greve começou no dia 17 e até agora não houve qualquer negociação. Reuniões no Ministério da Educação foram realizadas, mas quem manda no dinheiro é o Ministério do Orçamento e Gestão, então, é uma espécie de papo-furado, pois o MEC não tem poder de decisão. O que dizem os representantes do governo é que não há dinheiro para rever salário e que nada será concedido. Por outro lado, os trabalhadores sabem que todos os meses, o governo federal tira dos cofres públicos bilhões de reais para pagamento de dívidas – grande parte delas ilegítimas. Bem como investiu milhões de reais em obras para a Copa do Mundo, beneficiando grandes empresas da construção.  Ou seja, dinheiro há. Só que o governo prefere molhar o bico dos grandes bancos nacionais e internacionais. Por isso é necessária a queda de braço. Os trabalhadores param, lutam, buscam melhorias.

Como sempre acontece a greve quase nunca é só por ganhos trabalhistas. Embutida na pauta salarial estão as questões políticas estruturais, como o aumento de verbas para educação e a manutenção dos hospitais universitários públicos. Desde muitos anos que os governos buscam sistematicamente contaminar os HUs com a mão privada. Mas, isso se fez real a partir do governo de Luis Inácio, quando ele levou adiante a proposta de criar uma empresa para gerir os HUs. Empresa pública de caráter privado. E o que isso significa? Que, ligados a ela, os hospitais terão de trabalhar com “metas de produtividade”, o que é uma insensatez. O que podem os hospitais produzir? Eles existem para garantir a manutenção da vida e no caso dos HUs, para servirem de campo de estudo aos alunos da universidade. Administrados como uma empresa, os HUs abrirão uma porta privada, para atendimento de “clientes” com planos de saúde privado e os atendimentos pelo SUS podem ser diminuídos. Perdem as populações empobrecidas que têm no HU sua única chance de atendimento. Assim que a luta contra a EBSERH também faz parte da pauta da greve.

Só que como sempre acontece nas greves em educação, a luta se arrasta. Como os trabalhadores são, em geral, invisíveis, demora um pouco para que a falta deles seja sentida. Até porque o trabalho do TAE se dá em sintonia com o do professor e esses não estão parados. Agora, passadas três semanas de greve, a paralisação começa a se fazer sentir. Secretarias fechadas, biblioteca fechada, restaurante fechado, pesquisas paradas, tudo isso vai parando a roda do cotidiano. Ainda assim, nem a mídia local, nem a própria comunidade parecem se importar. O Conselho Universitário da UFSC, que se reuniu na segunda semana de greve, recusou-se a fazer o debate sobre a greve. A presidente do CUn, Roselane Neckel alegou que os trabalhadores não tinham solicitado uma discussão. Mas, um conselho realmente sério deveria discutir a greve, mesmo sem ser solicitado, afinal, uma categoria está parada e as atividades não estão na normalidade.

É por conta dessa maneira arrogante de lidar com os TAEs que as ações de greve começam a engrossar. Primeiro, os trabalhadores param, buscam diálogo. Sem ele, passam a realizar ações de impacto buscando visibilidade para a greve e abertura de negociação. Na UFSC, o espaço da reitoria foi tomado para realização de encontros e assembleias. Também são realizadas passagens nos setores para sensibilizar os que ainda não pararam. Outros atos são feitos nas rótulas, causando uma certa rugosidade no cotidiano e levantando ódios naqueles que não conseguem estacionar seus carros. Também foram realizados atos públicos nos campi do interior que amargam problema de toda ordem causados por uma expansão mal planejada e apressada.

E assim a greve vai caminhando, com tentativas de negociações em Brasília e com ações locais, buscando avanço nas pautas internas. No caso da UFSC, o tema das 30 horas tem sido dominante. Os trabalhadores querem garantir turnos de 12 horas seguidas, para que a universidade não tenha de fechar na hora do almoço. Melhoria para a vida do trabalhador e para a comunidade também. Só que mesmo com a administração tendo criado um grupo para estudar a viabilidade das 30 horas, não se avançou um passo. Agora, os dirigentes se escondem atrás de uma interpretação da lei e não se encorajam a mudar a vida da UFSC.

Nessa semana que se inicia os trabalhadores decidiram se juntar ao debate das Jornadas Bolivarianas, evento anual do Instituto de Estudos Latino-Americanos, que começa na quarta-feira, dia 09, às 8h30min, no Auditório da Reitoria. O tema não poderia ser mais propício para uma categoria que tem sido a ponta de lança na luta por um serviço público universitário realmente voltado à maioria da população, com qualidade e com sentido crítico: a teoria marxista da dependência. Diante de um governo que prefere encher os cofres dos bancos, pagando uma dívida ilegítima, em vez de melhorar os serviços públicos, a teoria da dependência e da superexploração cai como uma luva para compreender a correlação de força, a conjuntura e as possíveis saídas. Assim, durante os três dias nos quais teóricos do Brasil e de outros países da América Latina mostrarão a vigência dessa teoria para interpretar a realidade, os trabalhadores estarão atentos, buscando, nesses debates, elementos para a luta que está em curso.