quinta-feira, 12 de junho de 2008

A difícil arte de ser só



É assim. A gente sente um sentimento oceânico, ou um medo imenso ou qualquer outra coisa grandiosa, que precisa ser repartida. Então a gente busca os amigos. Mas, eles estão ocupados demais e não podem te ouvir. É uma festa, um encontro, o ônibus que já vai sair. E tudo se esvai. E a gente fica sozinha na calçada, com aquela sensação abismal de abandono. Nestas horas há dois caminhos a seguir.

O primeiro deles é choramingar que ninguém te ama, ninguém te quer e que os teus amigos são uns egoístas que só pensam em suas próprias demandas. Baseado nisso, ir para casa com a firme certeza de que se está mergulhado na solidão, que a vida é injusta, que as pessoas não são capazes de retribuir todo o amor e o cuidado que se tem com elas cotidianamente.

O segundo caminho é o da deusa. Saber que aqueles que têm como missão serem os cuidadores da vida, seja de gente, bicho ou planta, são definitivamente seres solitários. São os que não precisam de nada em troca, são os que simples e gratuitamente dão... Sem nada esperar. São os que, como Morgana, a maga, fazem sua parte neste mundo material e depois entram na barcaça que conduz às brumas, e nelas se perdem para sempre, plenos.

Os seres humanos são seres do turbilhão. Estão, como o coelho de Alice, sempre com pressa. Mas isso não significa que não amam ou não se importam. É que poucos deles têm essa deliciosa certeza de que nas brumas vive o sagrado e que na presença do sagrado é impossível se estar só.

Iniciada nas coisas dos deuses, eu sempre optei pelo caminho de Morgana. Sem vazios na alma, sem autocomiseração. Mas, sozinha, domo minhas próprias ondas e navego, apesar da névoa, por que sei que, nas brumas, me espera a inefável deusa, a mãe. Então, não há motivos para ter medo de solidão ou tristeza. No sagrado, tenho a melhor companhia.

Claro que este é um caminho de fé.